Título original: The Andalucian Friend
Autor: Alexander Söderberg
Nº de páginas: 488
Editora: Porto Editora
Sinopse
«Sophie Brinkmann é uma viúva que leva uma vida tranquila nos subúrbios de Estocolmo até conhecer Hector Guzman, um homem sofisticado e elegante. Ela não faz ideia de que sob o charme daquele homem se esconde algo sinistro. Hector é o cabecilha de uma organização criminosa. Ele está habituado a obter tudo o que quer, e o que ele agora quer é aniquilar os seus rivais.
Antes de se aperceber do verdadeiro mundo em que Hector se move, Sophie vê-se enredada numa implacável teia. Com a casa sob vigilância e a família em risco, em quem poderá ela confiar, quando a própria polícia é tão perigosa quanto os criminosos?
Neste primeiro volume da trilogia Brinkmann, Alexander Söderberg presenteia-nos com um magnífico romance sobre o mundo sórdido do tráfico de armas e droga, dando-nos ao mesmo tempo um retrato magistral da fragilidade humana.»
Opinião
O início de O Amigo Andaluz é promissor. Um número elevado de personagens e uma estrutura da narrativa complexa seriam duas premissas fortes para desenvolver um excelente romance, neste caso um brilhante policial nórdico. Contudo, essas são premissas que acabam por não se concretizar completamente. Tendo grandes expectativas inicialmente, é uma pena assistir a um desenrolar da história que não é tão apelativo como primeiramente se esperava.
De notar que a grande vitória deste livro é a própria temática - o mundo da droga, do tráfico e do crime - invariavelmente associada ao género policial. Söderberg mostra quão fundo pode ir a rede criminosa, infiltrando-se nos locais e nos estratos onde menos se espera. Existe claramente uma vontade de mostrar como se delineiam os planos estratégicos, quem deve ser atingido e de que maneira se pode usar algo, ou alguém, para atingir certos fins. Nisto, a narrativa ganha interesse, convidando o leitor a descobrir página após página uma sociedade em que estatuto e crime andam de mãos dadas, numa teia vertiginosa de corrupção e hipocrisia em que a recorrência à morte é apenas mais uma arma.
A leitura avança, pois, tendo em conta este pano de fundo controverso e problemático, que se adensa gradualmente. Na verdade, é esse o motivo pelo qual o ritmo não se perde consideravelmente. Partindo de uma estrutura de narrativa muito ambiciosa, quase cinematográfica, com frequente alternância de personagens e de cenários, a adicionar ao facto de existir um grande número de personagens, torna-se bastante complexa a compreensão dos múltiplos aspectos da história. Assim, quanto mais rápida for a leitura, melhor a percepção do leitor, apesar da concepção escolhida pelo autor não permitir, numa primeira fase, uma leitura espontânea, ávida como seria ideal. Não obstante, a cerca de metade do livro nasce esse fulgor essencial, enraizando um ritmo célere.
Relativamente às personagens, deparamo-nos com um grupo heterogéneo de figuras, com diferentes origens, que de uma forma ou outra acabam por ficar ligadas entre si num contexto comum. A obra ganha firmeza ao atingir rapidamente este elo. Embora não pareça, as personagens inseridas têm todas um determinado papel a desempenhar no cenário geral. Contudo, a relação propriamente dita entre as personagens nem sempre é clara, e aqui houve um trabalho incompleto por parte do autor. Explora-se muito pouco do íntimo das personagens - talvez por não ter sido esse o objectivo de Söderberg - o que constitui uma dificuldade para um leitor que vê nas personagens a essência de um livro. A maioria são meros figurantes, um nome que se associa a determinada etapa da trama, havendo apenas um trio de personagens que são suficientemente consistentes para serem conhecidas. São elas Hector, Gunilla e Lars, com especial destaque para Lars, cujas simplicidade e instabilidade criam uma dicotomia que testa a nossa capacidade de compreensão. Por outro lado, aquela que parecia ser a grande candidata a protagonista, Sophie, falha essa inicial previsão. Pessoalmente, não consegui estabelecer qualquer tipo de ligação emocional com Sophie, que muito se deve à sua constante opacidade e silêncio. Ainda assim, Sophie é uma peça fundamental no jogo, como se torna óbvio ao longo da obra. No fundo, todas as personagens se revelam humanas, apesar de todo o interesse materialista e carácter inexorável prementes que algumas apresentam. Pois todo o homem, a certo ponto, vacila, sofre e, se consegue, volta a erguer-se, mais forte que nunca.
Inerente ao bem desenvolvido trio de personagens já mencionado, surge uma imprevisibilidade que é da maior importância para instalar a curiosidade e fazer mover a história. Quando pensamos que já conhecemos as intenções daquela personagem, as nossas convicções são brutalmente desfeitas para dar lugar ao que antes seria improvável. Este é um feito extraordinário para um autor cujo estilo de narrativa é omnipresente, dando a cada instante um parecer de cada personagem. Até que ponto podemos realmente conhecer uma pessoa?
Sendo este um volume inicial de uma trilogia, considera-se o seu propósito cumprido. No geral, deixa-se patente um vasto leque de personagens que, decerto, serão mais aprofundadas e uma tela que apenas contempla as suas primeiras pinceladas. As possibilidades são muitas para um autor que se revelou hábil em estabelecer um enredo complexo, por vezes empolgante, que agrada tanto os amantes do género policial como a generalidade dos apreciadores de romances. Creio que O Amigo Andaluz é uma rampa de lançamento para uma trilogia frenética que atingirá todo o potencial que aqui teve a audácia de demonstrar.
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