O Herói das Eras - Parte II


Título original: The Hero of Ages
Autor: Brandon Sanderson
Nº de páginas: 384
Editora: Saída de Emergência
Colecção: Bang!

Sinopse
«Quem é o Herói das Eras? 
O mundo aproxima-se do fim, esmagado pela força imparável de Ruína. Vin, Elend e os companheiros procuram desesperadamente opor-se-lhe, mas nada do que fazem parece ter algum efeito ou, quando o tem, é o oposto do que pretendem. De que serve a mera alomância contra um deus?
Especialmente quando não parece haver nada além dela, pois até as misteriosas brumas, em tempos aliadas, parecem ter-se tornado malignas. Mas será que desistir é uma opção? Terá chegado o momento de baixar os braços e aceitar o fim de tudo o que se ama?
Num mundo sufocado pela cinza e abalado por erupções contínuas e violentas convulsões sociais que afetam até a sociedade pacífica dos kandra, são estes os dilemas com que os sobreviventes do velho bando de Kelsier vão ser confrontados neste derradeiro volume da saga.»

Opinião
Há vários elementos que tornam Mistborn uma saga brilhante e um deles é enraizar a constante expectativa. No entanto, se por um lado esse aspecto é garantido em cada livro, também Sanderson assegura que haja um leque de inesgotáveis surpresas. De facto, este último capítulo é rico em surpresas e, numa palavra, arrisco defini-lo como imprevisível. Quer a nível de enredo, quer de personagens, constrói-se um cenário arriscado e aliciante que, entre todos os que figuravam na mente do leitor, corresponde àquele que nunca se imaginou ser possível: precisamente o que deixa qualquer um perplexo por ser impossível de imaginar.

O Herói das Eras - Parte II retoma o momento em que Vin foi confrontada com questões fulcrais à realidade do império e à sua própria existência, sendo obrigada a rever o seu passado e a revisitar memórias terríveis. A partir desta premissa, uma série de mudanças ocorre tanto em Vin como nas restantes personagens, conduzindo finalmente às revelações que até aqui foram tão desejadas.

Na verdade, este é um livro de revelações. De resoluções. Ao longo dos restantes volumes, foi estabelecido um conjunto de factos que idealmente seriam irrefutáveis. Só aqui se vislumbra a dimensão e a complexidade do enredo. O esquema elaborado é de tal ordem minucioso e intrincado que cada revelação parece mais impressionante que a anterior. Mais ainda, todos os novos aspectos conseguem encaixar-se nos antigos e compor um quadro completamente plausível e homogéneo. É notável a forma como o autor constrói e desconstrói a obra, conseguindo encaminhar o leitor por onde pretende e, dessa forma, ludibriá-lo, desviando o foco do essencial que lá estava desde o início. A obra cresce de livro para livro, mas no fim tudo se resume àquela específica questão.

No que toca às personagens, neste livro torna-se evidente que cada uma tem um papel relevante na narrativa. Como seria de esperar, o ênfase recai em Vin e Elend, duas personagens habilmente delineadas e cujas acções são decisivas para o sucesso ou fracasso da missão. Detalhes do passado de Vin são clarificados, bem como a sua verdadeira importância nos acontecimentos que decorrem. O crescimento enquanto personagem é colossal e concretiza praticamente todas as expectativas que existiam. O protagonismo é partilhado ainda entre Susto, Sazed e TenSoon, três figuras que surpreendem bastante e cuja intervenção é extremamente importante para o desfecho da obra. Para além desse carácter narrativo, as personagens servem outro propósito, realçando o processo de procura da identidade e da aceitação do eu para atingir a nossa própria verdade - e nela acreditar.

A escrita de Sanderson continua exímia. A atenção ao pormenor, o ritmo oportuno e a alternância de focos entre as diferentes personagens permitem abarcar uma estética rigorosa e consistente. A aposta na alomância continua forte, sendo ainda desvendados os aspectos fantásticos mais profundos e básicos da obra que, inesperadamente, se revelaram mais proféticos e dicotómicos do que à primeira vista aparentavam.

Finalmente, penso que este livro e, por extensão, a obra tem apenas uma falha que - não o sendo necessariamente assim para outros leitores - assenta sobre a questão primordial deste universo de Mistborn que o autor não clarifica na sua totalidade. No capítulo final é patenteada essa mesma interrogação, deixando uma sensação agridoce e, de certa forma, frustrante. Intencional ou não, o autor consegue assim deixar o leitor em retrospectiva, analisando todos os detalhes para tentar encontrar essa resposta - concluindo que, mais uma vez, tudo faz sentido no puzzle com excepção desta peça em falta.

Mistborn assume-se, desta forma, como uma trilogia genial, tendo o seu apogeu neste último volume. Dotada de uma história original com elementos surpreendentes, personagens sólidas e uma escrita soberba, é uma saga notável da literatura em geral que agradará até o leitor que desdenhe do fantástico. Permanece a vontade de revisitar um dia mais tarde este misterioso e robusto mundo de Sanderson que tantas horas de leitura prazerosa me proporcionou.

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